Sempre fui uma entusiasta dos 'anjos', costumava ler sobre eles, acreditava em sua existência (de forma empírica e subjetiva)... e ontem, assim meio que sem querer, me deparei com a seguinte descoberta deste texto.
Não consegui parar de lê-lo, embora longo, e após, voltei a ler!
Enquanto lia, linha após linha, muitas pessoas queridas me surgiam. A certeza de que este texto tocaria a todos e a cada um de meus amigos de uma forma única e particular, me entusiasmou em reproduzi-lo aqui, como uma forma de 'reconciliação' com este blog e com a consciência de que 'Ainda acredito nos Anjos'!
Jac
"SOQUED HOZI: A CONFIANÇA"
A confiança é algo um tanto raro e desconhecido, meu amor;
Na realidade, nenhum de nós confia realmente, nem em si, nem em ninguém.
Como ignoramos nossa origem e nossa finalidade, o medo e a desconfiança fazem parte das principais características do nosso caráter.
No entanto, meu amor, por pouco que seja o nosso grau de confiança, sem ela não sobreviveríamos.
Pois, assim como é impossível sobreviver fisicamente sem oxigênio, água ou alimento, é impossível sobreviver mentalmente na mais absoluta desconfiança.
Alguém que perdeu, por uma razão qualquer, a confiança em si, começará a desconfiar cada vez mais dos seus próximos, por não possuir mais critérios internos que o ajudem a discernir a confiabilidade, ou não, das informações que recebe.
Um "louco", meu amor, é, assim alguém que, por perder totalmente a confiança em si, isolou-se completamente dos demais num mundo interior fantasmagórico.
Daí a importância, para cada um de nós, de cercar-nos de pessoas a quem amamos.
Pois, não te iludas, meu amor, "amamos" porque confiamos, e não o contrário.
Alguém que desperta o nosso amor é alguém que nos inspira confiança, alguém a quem ousamos abrir nossos corações.
Sem tais pessoas, nossa faculdade de sentir ou de raciocinar se deteriorariam, nos tornaríamos "loucos", nos converteríamos em "sistemas auto-referentes", como dizem os matemáticos.
Que felicidade é, então, meu amor, quando encontramos uma pessoa pela qual nos sentimos aceitos, seja lá como formos, seja lá qual for nosso passado ou nossos sonhos.
Digo "uma" pessoa, meu amor, porque tal intensidade de encontro geralmente só é atingida entre duas pessoas, mesmo que uma delas, ou mesmo as duas, consigam a mesma intensidade com outras pessoas, mas, geralmente, é em uma situação de face a face, ou de coração a coração, que essa intensidade é possível.
Uma relação assim é "sagrada", meu amor, uma autêntica relação "santa".
"Amigo é coisa pra se guardar do lado esquerdo do peito", canta Milton Nascimento.
Pois, chamamos de "amigo" uma pessoa que nos compreende, que nos aceita como somos, que nos assiste em nossas confissões de nossas vergonhas e culpas, uma pessoa a quem ousamos relatar nossos sonhos e planos mais íntimos.
Mas...
Quantos de nós sente realmente uma confiança absoluta no seu "amigo", meu amor...
Quantas vezes nos sentimos traídos, incompreendidos, ou até mesmo abandonados nos momentos em que mais precisávamos de ajuda e reconforto!
"Bons e leais" amigos são tão raros, que a maioria de nós comete o engano de crer que a amizade depende do acaso, da sorte, ou de uma "graça".
Mas a amizade só depende, UNILATERALMENTE, da nossa capacidade de confiar, meu amor.
Claro que muitas pessoas, por não suportarem viver num mundo em que reinasse a confiança, se aproveitarão, na primeira ocasião, da nossa boa vontade, para nos "trair" ou nos explorar.
O que nos incitará, em seguida, a sermos mais "amargos" e menos "tolos", menos "crédulos".
Existem, então, dois sistemas possíveis em relação à confiança, que criam dois tipos de "círculos", ou "espirais", diametralmente opostos, nas quais cada um de nós vive:
O sistema auto-referente e o sistema hetero-referente.
O mais comum, utilizado pela maioria quase absoluta das pessoas, é o sistema auto-referente.
A palavra "auto-referente" designa em matemática uma propriedade que resta injustificada, pois se "explica" unicamente a partir dela mesma.
Quando utilizamos expressões do tipo "pessoas não merecem confiança", ou "diga-me com quem andas e te direi quem és", e, simplesmente, nos contentamos de nosso "bom senso" para avaliarmos estas "verdades", somos vítimas da "auto-referência", meu amor.
Pois, apenas se estivermos abertos ao diálogo, e em permanente questionamento de nossas próprias posições, escaparemos à auto-referência, meu amor, ou à essa mania, tão humanamente nossa, de nos crermos...
"Donos da verdade"...
Uma metodologia que escapa, por excelência, à auto-referência, foi-nos proposta por Sócrates, que, através da expressão "dialética", exprimia o quanto temos necessidade do ponto de vista do nosso interlocutor, para que, juntos, possamos tatear em direção à "verdade".
Mas, com o correr dos séculos, a palavra "dialética", como tantas outras, foi extirpada do seu contexto original, e utilizada para outros fins.
Como subestimamos a necessidade do ponto de vista contrário ao nosso para o seu aperfeiçoamento, como confundimos um debate de idéias com um confronto entre pessoas, como mentimos a nós mesmos para guardarmos nossas razões, sem nos preocuparmos se estas são pertinentes, ou nos são nocivas, referimo-nos, unicamente, a nós mesmos, praticamente todo o tempo.
"Dogmatizando" nossas "certezas", somos cada um de nós, na maioria dos casos, sistemas mentais auto-referentes, que se comunicam apenas com quem pensamos que pensa como pensamos.
Poderíamos chamar, igualmente, esse nosso isolamento mental em torno de pessoas que não são críticas em relação ao que pensamos, de "círculo da desconfiança", ou "circuito fechado".
Isso explica porque confiamos em tão poucas pessoas, e abrimos nossos corações apenas a elas e, mesmo assim, tão poucas vezes, e apenas parcialmente.
A maioria de nós contenta-se desse círculo fechado, e admite poucas pessoas nele.
Nos sentimos, inclusive, de uma certa forma, "proprietários" destas pessoas a quem nos "dignamos" ofertar nossa confiança, e temos várias exigências e expectativas em relação a elas.
Mas nossos corações não atingem sequer o mais mínimo da capacidade que possuem de sentir e de amar em tais círculos, meu amor.
Pois esse circuito fechado gera medo, paranóia, tirania e possessão sem cessar, que são autênticos venenos do coração. Os componentes de tais circuitos se "sectarizam" em "famílias", ou "clãs", isolam-se dos demais, absolutizam suas relações, e se tornam, assim, "auto-referentes", numa relação entre vários, mas, também, numa amizade "a dois", meu amor.
Essa "folie à deux" desnatura a real característica da confiança, meu amor, que tem a vocação de se expandir, de brotar em um número cada vez maior de corações.
E, mesmo que sua intensidade máxima se apresente num contato entre duas pessoas, se há realmente confiança, não haverá tirania ou possessão, que já são, em si, sinais evidentes de desconfiança.
O segundo círculo da confiança é o sistema aberto, "dialético", ou "hetero-referente", meu amor.
Nesse caso, por mais intensa que seja a confiança de um parceiro no outro, por maior que seja a alegria de estarem juntos, por maior que seja a felicidade desfrutada nesses momentos de encontro, por maior que seja a tentação de guardar seu parceiro "só para si", no sistema hetero-referente, cada parceiro sabe que a "saúde" da relação depende da sua abertura, da sua capacidade de expansão.
A confiança leva à evidência que cada parceiro precisa se reciclar em outras fontes para que a relação possa se enriquecer do exterior, e não se asfixiar do interior.
Saliento que me refiro aqui à confiança, não a sexo, meu amor.
Pois, parceiros sexuais podem muito bem serem fiéis e não abrirem seus corações entre si, e até terem mais confiança em pessoas com as quais não nutrem relações carnais.
O sexo é, precisamente, o que mais pode, potencialmente, prejudicar uma relação de confiança entre duas pessoas, meu amor, pois, como o sexo tem uma forte conotação de possessão física, raramente parceiros sexuais conseguem vencer todo seu medo de perder a pessoa "amada", a ponto de abrirem seus corações inteiramente a elas.
Evidentemente, se além de uma confiança entre duas pessoas, existe um vínculo sexual atuando, não como empecilho, mas como reforço dessa confiança e dessa vontade de desejar ao parceiro o máximo de felicidade, seja como seja, e com quem seja, então, inigualável é a intensidade dessa relação.
Por isso mesmo, deixemos de lado o aspecto sexual da questão, meu amor, referindo-nos aqui, indistintamente, à confiança, seja no caso de "amigos" que sejam "amantes", ou não.
Até porque pode haver casos em que somos mais ciumentos de um amigo do que de nosso parceiro sexual...
Confiar é compartilhar, meu amor.
Confiar é ofertar, a quem confiamos, toda possibilidade ao nosso alcance para que ele seja ele mesmo, para que encontre o que precisa, para que consiga cumprir seu próprio destino.
Confiar é sinônimo absoluto de amar, meu amor.
A confiança, como o amor, só brota, assim, do solo da liberdade, onde não há mais medo.
Daí a UNILATERALIDADE, à qual me referia antes, em relação à amizade, meu amor.
Pois, só possuiremos confiança própria, quando soubermos confiar na própria confiança:
Quando aceitarmos confiar unilateralmente. Quando perdermos o medo de sermos traídos, quantas vezes forem necessárias, nesse aprendizado em confiar. Quando perdoarmos nossos amigos "traidores", compreendendo que muito maior do que o nosso pânico de confiar, é o nosso pavor que confiem em nós!
Pois como receber a confiança de alguém quando não confiamos em nós mesmos?
Antes que julgues quem te traiu, meu amor, medita sobre o fato que tua confiança deveria ter sido para ele um fardo pesado demais, já que todo "traidor" decerto não confia em si mesmo e necessita que o vejam como traidor, para que ele mesmo não esqueça que é a ele mesmo que ele sempre trai, em primeiro lugar.
Não serão, então, meu amor, a precaução e o cuidado levados ao extremo que evitarão que sejamos traídos.
Muito pelo contrário:
O excesso de controle aumenta a insegurança, a paranóia e a desconfiança, que são os principais fatores que contribuem ao aparecimento da traição.
Logo, quanto mais formos precavidos, cuidadosos, mais ocultaremos nossos corações de nós mesmos, por um lado, e mais desconfiaremos dos outros, por outro.
No entanto, se tentarmos ser sinceros o maior número de vezes possível, com o maior número de pessoas possível em nossa volta, em nossa volta se formará um círculo de confiança que produzirá cada vez mais confiança.
Afinal, meu amor, como poderia a desconfiança gerar outra coisa que desconfiança?
E, como poderia a confiança não gerar ela mesma, se não renunciamos a ela?
Como pode a árvore da desconfiança dar outros frutos que medo, traição e paranóia?
E, como a árvore da confiança poderia dar outros frutos que não fossem paz, alegria, amor e gozo intenso?
Prepara-te, então, para confiar cada vez mais, e UNILATERALMENTE, meu amor.
Perde o medo de ser traído, pois, de traição em traição, chegarás ao teu destino, atingirás a reciprocidade da confiança que ofertarás sem desanimar.
Já a tua "precaução" sistemática só te trará medo, desconfiança e solidão.
Aceita o ridículo de ser enganado, feito de tolo.
Não temas que "abusem" de ti.
Antes, teme que nunca sintas toda a riqueza que a confiança guarda pacientemente para ti.
Quando aceitares confiar, mesmo ao risco de que sejas vítima do escárnio público por tua ingenuidade, meu amor, o potente arquétipo da confiança, mais conhecido na mitologia do anjos como SOQUED HOZI, revelará em ti forças, belezas e uma capacidade de autoproteção que não ousarias sequer imaginar, meu amor.
Esse arquétipo também é conhecido como o "anjo da parceria", meu amor.
Mas essa designação não significa nada para quem ainda não refletiu sobre o fato de que parceria é, unicamente, uma questão de confiança.
Soqued Hozi, ou a confiança em seu estado puro, é o maior liberador possível das nossas potencialidades humanas, meu amor.
Não te preocupes, assim, com o número de "enganadores" que encontrarás no teu caminho, busca unicamente confiar.
Não te digo para não utilizares nenhum discernimento, nenhum critério e confiares em absoluto e indistintamente em tudo e em todos, meu amor.
Verás, entretanto, um dia, à medida em que confiares cada vez mais na confiança, que até isso será possível!
Mas, o que te peço aqui, é bem mais simples, meu amor, é simplesmente:
Abre teu coração mais ainda a quem já confias.
Utiliza isso para tentar, em seguida, ir cada vez mais longe na confiança, com um número cada vez maior de pessoas.
Tenta revelar teus sentimentos mais íntimos e tuas vergonhas mais inconfessáveis àqueles que já estão contigo na trajetória da tua vida há algum tempo.
Não teme seus julgamentos, pois se temes que te condenem, é porque, com certeza, já te condenastes, e será com a ajuda deles que conseguirás perdoar-te.
Confiança é tudo, meu amor.
Não a negligencies no teu dia-a-dia.
Não a subestimes, pois sem ela não obterás absolutamente nenhum progresso humano, não desfrutarás do gozo e da felicidade inimagináveis que só ela pode ofertar aos humanos que somos.
Soqued Hozi espera por ti, meu amor: captura-o!
Para isso: Confia na confiança.
Medita mais e mais sobre ela a partir desse modesto e incompleto panfleto em seu favor e à sua glória. Procurei aqui não ser eloqüente, meu amor, procurei não utilizar palavras rebuscadas, pois a confiança, por ser a mais potente das virtudes, é a mais humilde
Por ser a mais intimidante, é a mais intimidada.
Não pode haver beleza maior que a confiança, meu amor.
Pois a confiança é a essência mesmo da beleza.